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100 anos da Bauhaus e 5 mulheres inspiradoras

16 de abril de 2019

Walter Gropius publicou o manifesto que inaugurou a Bauhaus em 1919 em Weimar na Alemanha, inaugurando aquela que viria a ser a mais importante escola de arquitetura e design que já existiu. A escola de Gropius reunia artesãos, arquitetos e artistas da era moderna desconstruindo o medievalismo que ainda imperava na arte européia. Esse mês comemorou-se 100 anos desse histórico momento para a história do design.

Porém toda a desconstrução moderna à inovação nas artes não representava o mesmo nas hierarquias e nos costumes. Quando pensamos na Bauhaus, pensamos no edifício e nos inúmeros nomes masculinos que a fizeram famosa. Mas nunca pensamos nos interiores e nos detalhes. Quando paramos para analisar, as lâmpadas, as cortinas e até as fotografias tiradas na época, eram o trabalho de mulheres cujos nomes passaram quase despercebidos na história da escola.

Sigrid Wortmann afirma em seu livro Women´s Work: Textile Art from the Bauhaus, que estudantes mulheres chegavam na escola com uma diversidade de talentos, convencidas de que essa instituição avant-garde iria aceitá-las como iguais. Muitas dessas moças já haviam estudado arte antes em outros lugares, mas queriam aprender com mestres como Paul Klee e Kandisky. Porém eram segregadas e divididas em um workshop apenas para mulheres, o chamado “workshop de costura”, sem ao menos serem perguntadas se tinham interesse em tecelagem e costura.

Inicialmente, o número de mulheres era bem menor do que o de homens, mas a instituição passou a atribuir cotas a fim de balancear as aulas. Depois de completar o primeiro ano, chamado de básico, que era similar para ambos os sexos, as mulheres partiam para a costura enquanto os homens podiam escolher entre escultura, design gráfico, fotografia, artesanato e arquitetura.

Se a gente parar pra pensar um pouquinho, até hoje essa divisão é super presente entre os profissionais atuais: existem mais mulheres fazendo tecelagem do que marcenaria, mais mulheres fazendo interiores do que arquitetura, mais mulheres sendo curadoras do que fazendo arte….:(

Então vamos falar aqui de algumas dessas poucas mulheres que ajudaram a fazer a Bauhaus o que ela é e para que a gente continue reafirmando a importância do legado feminino na história do design.

Gunta Stölz

O trabalho de Gunta (1897-1983) que consistia de murais abstratos, tecidos industriais e tapetes; mostram a diversidade da expressão e experimentação dela com a tecelagem. Apesar de essa disciplina não ter sido uma escolha natural (que posteriormente viria a se tornar professora de tecelagem e costura), ela conseguiu levar os limites das tramas para um outro nível de design e de estética.

Depois de sair da Bauhaus, pós invasão nazista, Gunta se mudou para Zurique onde estabeleceu um pequeno negócio de tecelagem à mão devotando todo o seu trabalho à tapeçaria a partir da década de 60.

Quando a cadeira tubular de Marcel Breuer (super famosa hoje no mundo todo e conhecida como cadeira Wassily) foi apresentada em 1926, não foi só a estrutura que foi inovadora. A cadeira jamais seria possível de ser construída se não fosse o trabalho de Gunta com o tecido esticado no assento, encosto e braços. O tecido utilizado na época e chamado de Eisengarn, foi desenvolvido no workshop de tecelagem que ela ensinava. Infelizmente quando falamos dessa cadeira hoje só pensamos em Breuer…

Alma Siedhoff-Buscher

Alma Siedhoff-Buscher (1899-1944) entrou na Bauhaus em 1922 e, como suas colegas mulheres, acabou no workshop de costura. Um ano depois ela pediu transferência e foi aceita na aula de marcenaria, mas só porque alegou demonstrar interesse em design para crianças que tinha a ver com as disciplinas de marcenaria e escultura.

 

Os primeiros trabalhos de Buscher foram brinquedos coloridos feitos de madeira criados para venda o que se tornaram um sucesso e foram extremamente rentáveis para a escola (talvez o primeiro lego da história). Em 1923, ela desenhou alguns móveis para a Haus am Horn, uma casa construída por George Much, professor da escola, para exposição e showroom dos trabalhos daquele ano. Algumas peças incluíam uma variedade de caixas coloridas, um teatro de bonecos e um depósito de brinquedos.

Infelizmente Buscher foi morta na Segunda Guerra por um ataque aéreo perto de Frankfurt e não pode avançar em seus trabalhos, assim como outras mulheres da escola que conseguiram fugir da Europa.

Marianne Brandt

 

Marianne Brandt (1893-1983) conseguiu escapar do workshop de costura encorajada por Moholy-Nagy (famoso professor da escola) que identificou seus talentos com o uso do metal. Além disso, ela foi uma exímia fotógrafa, trabalhando com fotomontagem brilhantemente. Quando a Bauhaus se mudou da cidade de Weimar para a cidade de Dessau e focou seus trabalhos em colaborações com a indústria, Brandt começou a trabalhar com light design, criando luminárias que foram bastante vendidas pela escola, assim como instaladas por todo o prédio da própria Bauhaus. Sua Luminária Kandem criada juntamente com o aluno Hin Briedendieck em 1928, é até hoje um dos produtos mais vendidos em termos de iluminação no mundo inteiro.

Originalmente produzida em cobre, com braços ajustável e uma base fixa, a luminária Kandem se tornou um clássico fora de seu tempo e uma inspiração para muitos outros projetos de luminárias futuros. Hoje os produtos de Brandt podem ser comprados com o carimbo original na Alessi.

Depois da guerra, ela ensinou arte e design em Berlim e Dresden e posteriormente no Leste europeu onde praticou ativamente a pintura e a escultura no fim da sua carreira.

Anni Albers

Anni Albers (1899-1994) quando ingressou na Bauhaus, ficou extremamente infeliz em saber que seria obrigada a participar do workshop de costura, mas aos poucos começou a transformar seus estudos com tecidos em materiais para móveis e para construção civil. Quando pensamos em plástico e nylon, sempre associamos aos produtos surgidos no período pós-guerra, mas Albers estava tecendo com celofane transparente e fios de cobre já na década de 20.

Em 1949, Anni foi a primeira mulher artesã e tecelã a ter uma exposição solo no Museu de Arte Moderna de NY, o MOMA. Na exposição foram exibidos trabalhos com algodão, cabelo de cavalo, alumínio, juta e também uma coleção de jóias feita de materiais elétricos reciclados (um dos primeiros DIY da história). Em 1951, ela começou a desenhar tecelagens para a Knoll que estava procurando tecidos e materiais disruptivos para fazer parte dos móveis futuristas da fábrica, sendo ela a pioneira nesse tipo de trabalho.

Lucia Moholy

Uma das melhores maneiras de ver o trabalho de todas as mulheres citadas acima, assim como dos homens da Bauhaus, é através das fotografias de Lucia Moholy (1894-1989), primeira mulher do famoso professor László Moholy-Nagy.

Lucia nunca teve uma relação oficial com a Bauhaus, já que ela trabalhava com fotografia e edição e não se interessou em ser aluna da escola, mas ela aproveitou todo o movimento incensante ocorrendo ali na sua frente e usou uma câmera larga e posteriormente uma Leica, para documentar os trabalhos nos estúdios bauhasianos.

Quando a escola se mudou para Dessau em 1925, ela documentou toda a construção dos novos prédios, imprimindo seus negativos para catalógos de publicidade da escola, ajudando a espalhar a estética peculiar da escola através da valorização do que era produzido pelo seu olhar único de fotógrafa que valorizava as qualidades gráficas e espaciais de tudo que era produzido. Ela foi uma da primeiras pessoas a inaugurar a fotografia de arquitetura e ambientes, mudando totalmente a perspectiva de como as coisas era registradas para a posteridade.

Depois da guerra, a maioria dos negativos de Lucia foram perdidos e ele teve que recuperar muita coisa judicialmente, tendo que provar que fotografias usadas em exposições mundo afora e sem fonte específica eram suas… imagina o trabalho!

 

 

Esse post além de lembrar dessas profissionais incríveis, mostra o quanto, ainda hoje, as mulheres precisam lutar num mercado ainda super machista, para a valorização de seu trabalho em detrimento dos homens.

Façamos que nem essas criaturas talentosas, espalhando nosso trabalho com maestria ajudando a fomentar cada vez mais um universo de trabalho mais justo e colaborativo para nós mulheres.