No início do ano a Casa Vogue publicou uma matéria mostrando a casa da atriz Bruna Linzmeyer e que gerou uma baita polêmica no mundo virtual. Uma carreira de juízes da internet começaram a criticar a casa da atriz que nada mais é do que um apartamento cheio de afetividade e com a cara dela, pensado da maneira mais singular possível.
Criado com uma personalidade única, sem projeto de loja de planejados, sem porcelanato alto brilho, sem revestimentos da moda… simplesmente um lar montado de maneira afetiva, com pedacinhos de memória das paredes descascadas durante a obra, de livros velhos que ela ama ler, de plantas espalhadas pelo chão, de paredes riscadas com registros dos amigos e móveis adaptados de brechós e garimpos. Um lar com a cara dela.
O tribunal da internet, via facebook da revista, logo alegou absurdos como “Ela está doente da cabeça” ou “Sério, que ela precisou de arquitetos para isso?” ou até mesmo “Só eu fiquei com vontade de faxinar essa casa?”
Não estou criticando os fabricantes e lojas que lançam tendências, ainda bem que eles existem para aumentar cada vez mais a diversidade de materiais, cores, formas para que possamos ser cada vez menos generalistas e mais adaptados às realidades individuais de cada um. Na casa de Bruna mesmo, os azulejos antigos do banheiro foram substituídos por azulejos azuis, isso só foi possível porque existe uma fábrica que faz azulejos personalizados dessa cor.
Mas sim fiquei aterrorizada em como a padronização dos estilos de vida atingiu até os interiores. De repente além de ter que seguir todos os padrões impostos pela sociedade em que vivemos, como casar, ter filhos, fazer faculdade, arrumar um emprego tradicional, entre outros tantos…. agora até o nosso ninho, a nossa casa, onde passamos a maior parte das nossas vidas, tem que ter cara de casa de revista e ser igual a de todo mundo!
Lares cheios de plasticidade, montados, falsos e sem identidade, como vejo, infelizmente, muitos clientes pedirem por aí simplesmente porque, talvez, lhes falte conhecimento estético do que é compor um ambiente. Talvez lhes falte noção da variedade de opções, de estilos, de gostos, de materiais que existem hoje no mercado e do quanto podemos deixar aquela casa com a cara dele (a), criando um ninho de memórias e adaptado ao gosto peculiar de cada um sem necessariamente ser todo branco e brilhoso.
Isso é até algo que já falei nesse post aqui, sobre como ainda falta na base educacional das escolas mesmo, aulas de arte, estética que ajudem as pessoas a entenderem mais de que existe um mundo além da cor branca e das formas quadradas.
Aí vem aquela hora que é nossa função como profissional de catequizar, de ensinar, de ser meio psicólogo mesmo ao tentar mostrar o quanto podemos melhorar a qualidade de vida de acordo com as necessidades de cada um sem necessariamente fazermos tudo igual ao do vizinho.
Temos que entender que os gostos são muito diferentes entre as pessoas! Estudei muito sobre estética e padrões de gosto no meu mestrado e logo que li os comentários da matéria, fiquei me coçando para escrever sobre isso.
Daí motivada pela reportagem fiz uma pesquisa no meu facebook e pedi para as pessoas analisarem 4 móveis de grandes designers brasileiros (não coloquei os nomes deles na pesquisa). Todos os móveis fogem dos padrões estéticos tradicionais, são considerados polêmicos e apesar de não parecerem, tem um valor ($$$$) bastante alto dentro do mercado de mobiliário. São super valorizados no exterior, premiados e estão em museus mundo afora. A pesquisa teve 141 respostas e olha aí o resultado, que polêmico, gente!
Você compraria esse objeto? – Esse era a pergunta inicial da pesquisa:
Esse sofá todo rasgado e feito de lona reciclada da Decameron é ganhador do prêmio IF Design 2016. Quase 35% das respostas afirma que não compraria ou só se fosse muito barato. Há quem tenha dito ainda, nas respostas adicionais que compraria e “faria uma reforma”….?????
A estante Arapuca de Rodrigo Almeida talvez seja o objeto mais polêmico da pesquisa. 73,8% disseram que não gostaram da peça, que é um ícone do design brasileiro que fez grande sucesso na Maison et Objet de Paris e na Feira de Milão no ano em que foi exposta e é um dos objetos mais pinados no Pinterest em se falando de design brasileiro. Alguns inclusive não entenderam para que serve, tamanho o caráter de manifesto que a peça tem.
A escrivaninha Stitches dos irmãos Campana feita em couro curtido e com costuras naturais e manuais já teve uma melhor aceitação, mesmo assim apenas 21,3 % comprariam a peça.
E a premiadíssima cadeira Favela novamente dos Campana foi rejeição pura. A peça é construída a partir de sarrafos de madeira reutilizados, foi lançada em 2001 e está exposta como destaque do design brasileiro no Museu Vitra. A peça é uma alusão ao caos das cidades brasileiras.
Não estou julgando o caráter estético das peças, para alguns, é claramente esquisito ver o feio, o caos, o reaproveitamento, o manifesto exposto em forma de objeto. E é normal que sintam repulsa e não queiram tais objetos em suas casas. Mas talvez falte um pouco de maturidade estética para entender a beleza do caos, e novamente, aquilo que falei sobre a sensibilidade do respeito ao outro e do entendimento sobre um design mais humano.
Até porque é disso que se constitui a casa brasileira! Nossos lares são exatamente cheios de rusticidade, reaproveitamento, caos, cores, adaptações, improvisos… Os objetos da pesquisa acima são exatamente fruto dessa semente nacional. A casa de Bruna é também fruto de uma brasilidade única. Quem já assitiu ao programa Casa Brasileira do GNT pode comprovar isso, nos exemplos maravilhosos mostrados no programa.
Vamos buscar mais decorações afetivas e menos decorações plásticas, a afetividade, por mais estranho que possa parecer, é a maneira mais legal de construir uma casa mais confortável, singela, única e com a cara do dono.